2015 foi o ano em que completei 40 anos de idade. Cumpro minha promessa de comemorar o meu aniversário de volta à minha terra, da qual eu me afastei voluntariamente por seis anos. Mais importante que essa volta, foi esse período longe.
Muito fui questionado quando me decidi por ir morar em Fortaleza por um tempo. Muitos acharam que eu iria para não mais voltar. Outros tantos acharam que, uma vez lá, eu permaneceria. O que posso dizer é que, por mais que duvidassem, o meu retorno era a pedra fundamental da minha ida, e nunca houve como essa decisão ser modificada, não importando os fatores (e isso teve um custo).
Esse período, que foi para mim ao mesmo tempo exílio e retiro, me foi fundamental para uma retomada de certos pontos na minha vida. Nunca tive como objetivos me reinventar ou me reconstruir, mas me reformar, executar certos consertos essenciais para que eu pudesse colocar as coisas em seus devidos lugares e esta arrumação só pode ser feita agora, após minha volta.
Hoje, talvez (e ainda com algum receio de ser mal compreendido), posso responder a uma pergunta que invariavelmente me era feita enquanto morava em Fortaleza: "Você gosta daqui?". Há duas verdades que respondem a isto: 1. Gostar ou não da cidade nunca teve muita importância, o que, consequentemente, fez com que eu não me importasse em gostar ou, menos ainda, me importasse em criar algum vínculo afetivo com o local e 2. Fortaleza é uma cidade até bonita, litoral etc., mas com indisfarçáveis problemas como um racismo e um machismo tão transparentes e expostos que chegam a assombrar tal a "naturalidade" de certas situações. Nunca houve como eu gostar de Fortaleza, mas tive muita sorte de me cercar das pessoas certas e é o momento de falar delas.
Cada pessoa com a qual eu interagi nessa cidade foi fundamental no meu processo de retomada. Eu tinha que ser mais correto, mais centrado e mais humano do que eu jamais fora. Ninguém sabia quem ou o que eu era. Para todos, assim como para a cidade, eu era apenas "alguém de fora". Ter a consciência disso gerava o cuidado redobrado de saber onde pisar e o que dizer, não que com isso eu me visse forçado a, o tempo todo, "pisar em ovos", embora o começo tenha sido realmente assim, mas aprender se perceber como "o outro" me fez ter muito mais sensibilidade ao também enxergar o outro como alguém que tem uma historicidade que eu desconheço e devo respeitar.
Entre algumas mudanças, Fortaleza é a cidade onde eu deixei de ser "músico" para me tornar apenas "o cara do violão". Mas me tornei mais professor, então a balança equilibrou.
Na continuidade deste lidar eu fiz contatos, amizades sinceras, me encantei, me apaixonei, amei e até fui amado. Muito. Cada pessoa com quem estive pode ter a certeza de que, no que depende da minha vontade, jamais será esquecida, por mais que os momentos que tenhamos compartilhados tenham parecido, a uma visão menos atenta, fugazes ou irrelevantes. Não foram. Trago todos comigo e a saudade ficará, cada um em seu devido grau, com a sua devida importância. Cada um de vocês trouxe um bocado de luz e calor neste período de inverno da minha alma, ainda mais brilhantes que o sol da "Terra da Luz".
Já faz seis meses que voltei e ainda não consegui rever boa parte dos amigos daqui. Por uma série de motivos, ainda não foi possível. Alguns desses motivos fazem parte justamente desse processo de retorno. Eu nunca menti para mim mesmo que seria fácil, que seria tranquilo. Mas eu os reverei.
Alguns eu não poderei rever porque foram para outros pousos ou, como se diz eufemisticamente, "se foram". Destes, a impossibilidade de ter me despedido sempre será muito dolorida, especialmente por não estar junto dos amigos em comum e não ter com quem compartilhar e mesmo aliviar essas perdas.
Mas estou de volta à mon pays, onde, como eu costumava dizer, "eu não preciso saber o nome das ruas, pois as ruas já sabem o meu nome". E as ruas e as pessoas me conhecem, com toda a minha história e, consequentemente, meus erros e defeitos. Espero que ainda me reconheçam. Espero ter conseguido voltar melhor.
Eu poderia continuar muito mais, mas eu só quero agradecer a cada um que esteve comigo neste tempo de partida e retorno, que foi para mim como um grande ano que durou exatos 2.273 dias.
Nos reveremos, de algum modo, em 2016. Enfim, um novo ano, em que o novo e o já estabelecido ganharão nova amálgama. Que o novo surja e que o passado nos dê base. Hora de conferir de verdade se "a vida começa aos 40". Estou acreditando que, se não começa, pelo menos se renova.
Conto com a ajuda de vocês.
Beijo do velho.