“Vale o escrito!”, diz um velho ditado. A importância de uma palavra escrita em um papel dá ao homem uma impressão de que coisas abstratas como a verdade, a moral e mesmo os sentimentos como o amor têm um lado concreto.
Tudo há que estar escrito. Em papiros, papéis; na pedra, nos muros; em uma camiseta ou sobre o couro; na história ou nas estrelas. O homem se encontra, se descobre e se reconhece na palavra escrita.
Desde o Decálogo, onde o próprio Deus teria escrito as leis para a humanidade, até as palavras ocas dos “Minutos de Sabedoria”, o homem é o que está escrito de si e para si. Partindo desse pensamento, pode-se dar ao objeto “livro” uma importância mágica, sagrada. Tê-lo em nossas estantes ou nossas mãos nos dá a certeza de ser alguém diferenciado do resto. Somos os portadores do conhecimento.
O livro tem também uma grande importância por conceder ao seu possuidor um certo status e o material físico do livro também. Uma edição comemorativa, capa de couro, bordas em ouro, não tem as mesmas palavras de uma outra? Sim, mas o objeto tem sua importância. É o poder de dizer: “Eu tenho a edição limitada de
Les Misérables!”.
“Um país se faz com homens e livros”, disse Monteiro Lobato. Uma cidade, para ser respeitada, deve possuir uma grande biblioteca. Entre as grandes malfeitorias da História figuram episódios de queima de livros; o incêndio da Biblioteca de Alexandria, as queimas públicas de livros promovidas por Hitler e Mao, como a Inquisição fazia queimar as mulheres que acusavam de bruxas. Pode-se aleijar toda uma sociedade usando apenas a censura.
Há também uma apropriação afetiva desse objeto. É uma coisa que podemos chamar de nosso, abraçar, disputar sua posse (“Devolva o Neruda que você me tomou e nunca leu”¹), que podemos usar para construir não apenas uma casa, mas um lar (“Onde eu possa plantar meus amigos/ Meus discos e livros/ E nada mais”²).
Esse objeto que é maior que nós, que dependemos dele para garantir nossa palavra (“Juro sobre a Bíblia”, eu prefiro jurar sobre um bom dicionário).
Nos livros encontramos palavras que tomamos como nossas e as copiamos em nossos diários, nossa memória (e dizer de cor) e, hoje em dia, tatuar em nossa própria pele.
É o que somos, é o que eu sou. Estava escrito nos papiros, nos papéis; na pedra, nos muros; em uma camiseta, marcado em couro. Está escrito na História. Estava escrito nas estrelas. Está nos meus livros na minha estante.
“Os livros na estante já não têm mais tanta importância,
Do muito que eu li, do pouco que eu sei, nada me resta.”
(Léo Jaime)
(Tradução de Alan Robert de texto de 08 de abril de 2008 do mesmo autor)¹BUARQUE, Chico.
Trocando em Miúdos²RODRIX, Zé.
Casa no Campo